terça-feira, 24 de março de 2015

A crise do petróleo muito além da Petrobras


Há, no Brasil, um déficit de atenção sobre os impactos geopolíticos, econômicos e sociais da queda de 50% nos preços mundiais do petróleo desde meados do ano passado.


Carlos Plácido Teixeira
Colunista - Radar do Futuro - Diário do Comércio

De tão voltados para a agenda política e policial que envolve a Petrobras, no Brasil apenas uns poucos grupos discutem o que anda ocorrendo no mercado internacional de petróleo. As atenções se concentram na operação Lava Jato, que, já há um ano, caça corruptores e corrompidos na relação entre a estatal e empreiteiras. E no aumento recente dos preços dos combustíveis nos postos brasileiros. Enquanto isso, há um déficit de atenção sobre os impactos geopolíticos, econômicos e sociais da queda de 50% nos preços mundiais do petróleo desde meados do ano passado.

No exterior, análises sobre causas e consequências fervilham, em proporção inversa às certezas sobre as tendências do mercado de energia e da política global. Na avaliação mais óbvia, para os países importadores, o óleo mais barato significa redução de despesas. Para os exportadores, receitas menores. Existe uma grande redistribuição de renda entre os dois lados. No meio, e certamente com grande importância para o planeta, há a guerra de interesses, envolvendo países e corporações multinacionais.

"O preocupante da queda do petróleo é a possibilidade de quebra de países emergentes e que pegue muitos investidores no contrapé. Esse é o medo que está se espalhando nos mercados nestes dias e por isso o dinheiro está indo para investimentos-refúgio como o dólar ou os títulos norte-americanos", alerta no site do El País o analista Juan Ignacio Crespo. Entre os países mais prejudicados pela queda do preço estão Brasil, Venezuela, Equador e Rússia, que além disso enfrenta as sanções econômicas por seu conflito na Ucrânia. A queda dos preços altera o equilíbrio entre as nações.

Renováveis - Nesse mar cheio de maremotos, também existem os que temem possíveis danos sobre o futuro dos investimentos em projetos de fontes alternativas de energia. No ano passado, energia solar, eólica, biocombustíveis e outras fontes receberam 310 bilhões de dólares em verbas. Com o mundo nadando sobre o óleo barato, o receio passa a ser de que a expansão do dinheiro aplicado e da consciência sobre a necessidade de redução da demanda pelo petróleo possa ser reduzida. Afinal, como prevê a maior refinadora da Ásia, a Sinopec, demorará um longo tempo para que os preços internacionais do petróleo voltem a 100 dólares por barril.

"Há razões para acreditar que pessimistas podem estar certos", avalia Ben Schiller, um jornalista e especialista do site Co.Exist. Nos Estados Unidos, onde os preços do combustível fóssil caíram de US $ 3,50 para US $ 2 por galão - um galão equivale a 3,8 litros -, quem comprou um automóvel elétrico pode considerar que não fez um bom negócio. O proprietário do automóvel paga um prêmio para um carro elétrico e, no final das contas, deixa de perceber benefícios no abandono do combustível fóssil. "Da mesma forma, se uma usina funciona com óleo, como é comum no Caribe e no Oriente Médio, então é menos provável que o empresário migre investimentos para uma usina de energia solar", exemplifica.

A história registra acontecimentos preocupantes envolvendo reviravoltas na relação entre energia limpa e o petróleo. Na década de 1970, a explosão dos preços do petróleo foi seguida por uma forte expansão dos projetos em energia de etanol, eólica e outras fontes renováveis. A bolha da época estourou com a super abundância da oferta de petróleo, registrada na década de 1980. Para Ben Schiller, os investidores têm razão para temer que algo semelhante possa acontecer novamente.

No Brasil, o programa de estímulo à produção do álcool segue a mesma distorção histórica, com momentos de estímulo e de quase decadência por conta das oscilações do mercado de petróleo. Foi uma resposta à crise internacional do petróleo, deixada de lado quando os planejadores passaram a acreditar que o país pode ser autossuficiente na produção do produto.

O El País encontra motivos para acreditar em impactos favoráveis. Para a publicação, a indústria da energia solar e a eólica talvez se vejam forçadas a avançar ainda mais na redução de custos. Assim, quando o preço dos hidrocarbonetos voltar a subir – o que ocorrerá cedo ou tarde –, as energias renováveis e menos poluentes terão custos e preços que lhes permitirão competir melhor do que nunca com o carvão e o petróleo.

MAIS TENDÊNCIA
Alimentos - No mercado internacional, a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO, na sigla em inglês) reconhece a dificuldade de projetar perspectivas para o comportamento dos preços dos alimentos, que estão em queda no mundo, diante de múltiplas incertezas do cenário.

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