sábado, 30 de maio de 2015

Robôs não substituirão os jornalistas

Em momento de crise, jornalistas temem perder os seus empregos para robôs. Uma coisa é a crise das empresas jornalísticas, que não conseguem reverter a perda de receitas. Outra, é o futuro da profissão diante da automação. 

Carlos Plácido Teixeira
Editor - Radar do Futuro

O jornalista será substituído por robôs no futuro? Não tenho a menor dúvida em responder que não. Algumas atividades dentro do jornalismo poderão ser automatizadas. E o profissional poderá não ter emprego no futuro, o que é outra história, contada pela crise do setor. Mas ser integralmente eliminado do sistema de produção de notícias por conta de robôs é muito pouco provável. E quem acredita em previsões de tal tipo sofre a influência da falta da racionalidade típica dos momentos de pânico, o que leva muita gente a ver com pessimismo extremado qualquer avanço das tecnologias sobre o mercado de trabalho.

Pense no trabalhador ou trabalhadora que, até outro dia, ficavam na saída do estacionamento, enfurnados dentro de um guichê. A função pode ser bem definida em qualquer fluxograma: desejar bom dia, receber o tíquete, inserir na máquina, verificar o valor - que já está sendo mostrado no visor - dizer quanto foi ao consumidor - que também já viu -, receber o dinheiro, digitar o número, conferir o valor do troco, abrir a gaveta, tirar o troco e entregar ao proprietário do automóvel. E agradecer polidamente, desejando um bom dia, que mal será ouvido pela maioria dos frequentadores.

Comece a perceber como uma onda já vem ganhando volume, caso você frequente determinados shoppings. Os funcionários já começaram a ser substituídos por máquinas. Uma palavra sintetiza as razões: rotina. O que você puder resumir em um fluxograma simples como o apresentado acima estará fadado a desaparecer do mapa nos próximos anos. Depende mais da conveniência do dono do estabelecimento do que da disponibilidade de tecnologias.

Tudo bem que muita gente lida com o dia-a-dia da produção de notícias como uma rotina: chegar na redação, receber a pauta, fazer entrevistas, redigir a matéria, entregar ao editor, ir embora. Ou como o exemplo dos textos da cobertura das bolsas de valores: "A Bolsa de Valores de São Paulo fechou em (assinalar o correto) alta/baixa/estável ontem/na sexta-feira, aos "n" pontos. As maiores altas foram do papeis a,b,c e as maiores quedas foram de x,y,z. Já no mercado de câmbio, o dólar subiu/caiu e foi a tantos reais". E por aí vai, como um ritual monótono.

Outro exemplo de rotina: o governo anuncia medidas de cortes do orçamento. O processo pode ser descrito da seguinte forma: repercutir com o economista Maílson da Nobrega. Publicar o texto, passar para o editor. Ir embora para casa. Mas as coisas às vezes saem do roteiro: o que, o ministro da Fazenda não apareceu? Você finalmente percebeu que o ex-ministro de Sarney não merece credibilidade? Quem acredita que tais processos serão passíveis de automação pode pensar em procurar um profissional de apoio, um psicólogo, cuja profissão também não deve ser substituída por robôs, porque exige habilidades humanas que mesmo a inteligência artificial, que está evoluindo mesmo, provavelmente não será capaz de alcançar.

Em síntese, algumas rotinas, como a divulgação dos dados do fechamento do mercado financeiro, agendas culturais, resultados de jogos de futebol e resumos sobre acidentes de trânsito realmente podem ser feitas por máquinas. Mas estagiários, em países como o Brasil, devem continuar sendo mais baratos.

Aliás, profissionais, que desempenham papeis de neuróticos ou terroristas ao garantir que os robôs dominarão o espaço do repórter citam com frequência a agência de notícias Associated Press. A empresa de fato investe em sistemas automáticos. Com foco em esportes. No ano passado, a AP anunciou que usaria a tecnologia de automação de uma empresa chamada Automated Insights para produzir histórias sobre relatórios de ganhos. Segundo um comunicado da empresa, "em vez de fornecer 300 histórias manualmente, podemos fornecer até 4.400 matérias automaticamente para as empresas em todo os Estados Unidos a cada trimestre". Ainda de acordo com os porta-vozes, a produção extra não resultaria em cortes de empregos ou cortes na cobertura de acontecimentos.

No final das contas, há pelo menos dois fatos muito mais importantes do que o medo que envolve o assunto. A própria Associated Press reconhece que será possível ampliar a quantidade de material produzido, com a cobertura das várias divisões dos campeonatos de beisebol e basquete. Ou seja, a agência terá maior volume de informações para vender. E a cobertura de fatos, como os jogos esportivos, gera especialmente dados, as estatísticas tão apreciadas pelos norte-americanos. Os tais robôs escrevem mesmo. Mas são relatórios. As histórias vão continuar dependendo de humanos, como a própria AP reconhece.

   

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