Ao contrário do defendido por vários estudiosos do passado, o Brasil possui uma identidade nacional consolidada, expressa em opiniões coesas entre os diferentes perfis socioeconômicos, que identificam características típicas dos brasileiros. É o que revela o Projeto Brasilidade, primeiro da série Estudos da República, desenvolvido pela República – Opinião dos Brasileiros, empresa de pesquisa de opinião pública.
Desenvolvido pela República – Opinião dos Brasileiros, empresa especializada em pesquisa de opinião, o Projeto Brasilidade analisa em profundidade a autopercepção do brasileiro hoje, após 20 anos de democracia e de estabilização econômica no país. Qual o impacto desse periodo sobre a identidade nacional e a autoestima do brasileiro? Para começar, o “jeitinho brasileiro” é visto agora de forma muito mais positiva que negativa, sinônimo de adaptação, criatividade, flexibilidade e uma maneira de resolver os problemas mantendo a alegria. E o “complexo de vira-lata”, que marcou época descrito por Nelson Rodrigues, caiu por terra diante do predomínio de uma autoestima elevada – 78% dos pesquisados têm orgulho de ser brasileiro.
O Projeto Brasilidade, primeiro da série de Estudos da República, revela o que significa ser brasileiro no século 21 e desvenda a nova alma nacional. Os três perfis de brasileiros identificados na pesquisa – os que lutam pela sobrevivência (38%); os que aspiram pela estabilidade (26%); e os que buscam aprimoramento (36%) – são a base de uma nova sociedade, mais complexa e rica, mais amadurecida e informada.
Ao contrário do defendido por vários estudiosos do passado, o Brasil possui uma identidade nacional consolidada, expressa em opiniões coesas entre os diferentes perfis socioeconômicos, que identificam características típicas dos brasileiros. É o que revela o Projeto Brasilidade, primeiro da série Estudos da República, desenvolvido pela República – Opinião dos Brasileiros, empresa de pesquisa de opinião pública. O Projeto Brasilidade é uma pesquisa sobre a autopercepção do brasileiro 2010, que mostra o que mudou após mais de 20 anos de democracia e estabilização econômica no país. Partindo de análises clássicas como as realizadas por Gilberto Freyre, Darcy Ribeiro, Sérgio Buarque de Holanda e Roberto DaMatta, a República reuniu antropólogos, psicólogos, cientistas políticos e sociólogos para descobrir o que significa ser brasileiro no século 21 e qual o impacto desse período recente sobre a identidade nacional e a autoestima.
Segundo o sociólogo e cientista político Rodrigo Mendes Ribeiro, diretor-geral da República e coordenador da pesquisa, o estudo revela “um novo Brasil, com importantes mudanças que originaram uma sociedade mais complexa e rica, que não cabe mais nos estereótipos, cujo fardo histórico está sendo abandonado para abrigar novos traços de brasilidade”. Após identificar e analisar a mudança do cenário nacional, a pesquisa tomou como ponto de partida a pergunta: a autopercepção do brasileiro também mudou? As respostas deixam claro que sim: com autoestima elevada, 78% dos entrevistados afirmaram ter “orgulho de ser brasileiro”; há otimismo, o futuro é visto com bons olhos; e o “jeitinho brasileiro”, que na visão de estudiosos e acadêmicos sempre foi associado a características predominantemente negativas, hoje ganhou uma dimensão muito mais positiva. É o atributo que, na visão dos entrevistados, mais define o que é “ser brasileiro” hoje – significa ser dotado de “criatividade”, “flexibilidade”, “improviso”, “jogo de cintura” e “um jeito de resolver os problemas mantendo a alegria”.
“O brasileiro inicia a década com muita esperança, altivo, após ter passado por uma turbulência internacional que pouco o abalou. Apesar da desigualdade ainda presente, a pobreza e a insatisfação diminuiram; a classe média aumentou, assim como a renda, o acesso à internet, o consumo de itens de conforto; sete entre 10 brasileiros acreditam que o povo tem hoje maior poder de compra. Aumentou a percepção de melhoria no País”, destaca Ribeiro. A avaliação positiva do país implica necessariamente em autoestima mais elevada. Orgulho, avaliação positiva do país e visão de futuro põem por terra o “complexo de vira-lata”, expressão cunhada pelo escritor e dramaturgo Nelson Rodrigues, associada ao “ser brasileiro”. Por “complexo de vira-lata”, Rodrigues entendia “a inferioridade em que o brasileiro se coloca, voluntariamente, em face do resto do mundo”.
Os dados do Projeto Brasilidade revelam que há uma identidade nacional assentada em um elevado grau de coesão das opiniões em torno de características comuns aos brasileiros. O que faz com que as pessoas se sintam brasileiras? Predomina a visão do brasileiro como “batalhador”, com alta capacidade de superação; que mantém a alegria mesmo na adversidade; e faz uso do “jeitinho” como um recurso de adaptação social. Existem alguns matizes regionais ou de classe, mas o que predomina é uma identidade nacional bastante clara e definida. Com base na teoria da motivação de Maslow, a pesquisa identifica também três perfis de brasileiros: os que lutam pela sobrevivência: 38%; os que aspiram a estabilidade: 26%; e os que buscam o aprimoramento: 36%.
Com módulos qualitativos e de quantificação, a pesquisa foi conduzida no mês de março de 2010, com quatro grupos focais e 1.272 entrevistas (homens e mulheres, de 18 anos a 70 anos), residentes nas principais cidades brasileiras, pertencentes às classes A, B, C, D e E (critério Brasil). Do Sudesde, 55% dos entrevistados; 19% do Nordeste; 14% do Sul; 7% do Centro-Oeste; e 5% do Norte, sendo 48% dos entrevistados do sexo masculino e 53% feminino. A maioria dos entrevistados é jovem – 25,1% possuem entre 30 e 39 anos; seguidos de 21,9% com idade entre 18 e 24 anos; e 14,2% com idade entre 25 e 29 anos. Os entrevistados na faixa etária entre 50 e 59 anos são 12,1%; entre 60 e 64 anos são 3,5%; e entre 65 a 70 anos, 4,2%.
Segundo Rodrigo Mendes Ribeiro, “o principal diferencial da pesquisa é a forma abrangente com que aborda a questão do ´ser brasileiro´. Não havia até então um estudo com uma visão assim abrangente para caracterizar a identidade nacional”. O Projeto Brasilidade adota metodologias sofisticadas, que hoje não estão presentes nas pesquisas de opinião pública comumente realizadas. A República conta com professores, psicólogos, sociólogos, cientistas políticos, com uma visão que busca identificar sentimentos, valores e motivações que estão por trás dos números em geral constatados nas pesquisas de opinião pública.
“Partimos do princípio de que é preciso conhecer o brasileiro de forma sistemática e gerar mais pesquisas, que por sua vez serão baseadas em um conhecimento que só a República tem”, afirma Ribeiro. Diante das novas demandas sociais, a questão que se coloca é como as instituições políticas e sociais, as empresas e os serviços públicos podem corresponder às novas expectativas. Ao realizar o Projeto Brasilidade, a República se propõe a enriquecer esse diálogo com a sociedade, ajudando-a a se “autopensar” diante de novos cenários e caminhos que se apresentam.
Contexto histórico
A década de 1990 marcou o início de um processo de transformações socioeconômicas no Brasil; alteração com reflexos significativos no plano internacional, na forma como o País é visto no exterior. Emerge desse contexto de estabilização macroeconômica – 16 anos de inflação baixa, iniciada com o Plano Real, em 1994 – e da mobilidade social, um novo Brasil. A modernização da indústria para fazer frente aos produtos importados, um novo alinhamento da economia mundial, aumento de escolaridade do brasileiro e a implementação de políticas sociais de redistribuição de renda (Bolsa Escola e Bolsa Família, por exemplo) resultaram na mobilidade social ascendente, especialmente das classes C e D, e na diminuição das desigualdades sociais.
Nas últimas duas décadas, a credibilidade da economia nacional se consolidou no exterior. A conquista do Investment Grade, a rapidez com a qual o Brasil superou a crise financeira de 2009, os superávits sucessivos da balança comercial, a descoberta de petróleo e gás no Pré-Sal, e a condição tecnológica para explorá-lo, reforçaram a credibilidade e a posição internacional do País, fazendo com que o Brasil figure como parceiro estratégico e líder do Cone Sul; posição de destaque no cenário internacional. A estabilidade institucional, governança democrática e a superação de crises no legislativo, executivo e judiciário – vivenciadas no período – mostram que o sistema político brasileiro está maduro. A esses fatores contextuais, soma-se a escolha do Brasil para sediar a Copa 2014 e as Olimpíadas 2016.
A partir desse cenário positivo, o Projeto Brasilidade buscou contrapor os traços históricos e culturais à autoimagem dos brasileiros em 2010, com base nas perguntas: uma visão negativa dos brasileiros ainda sobrevive, mesmo depois das grandes transformações pelas quais vem passando a sociedade? Qual o impacto dessas mudanças na identidade nacional e na autoestima dos brasileiros?
A questão da identidade nacional tem sido objeto de estudo de intelectuais brasileiros de diferentes vertentes. Da perspectiva evolucionista de Silvio Romero, Euclides da Cunha e Nina Rodrigues – que defendiam que o “branqueamento da população, salvou-a da degeneração” – à visão moderna de Manoel Bomfim, Mário de Andrade, Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda e Câmara Cascudo, autores que trouxeram inovação ao lançar um novo olhar à cultura nacional.
O livro “Administração e estratégia de desenvolvimento”, em 1966, de Guerreiro Ramos, foi o primeiro a tratar a questão do “jeitinho brasileiro”. De acordo com Ramos, o jeitinho seria a categoria central da sociedade brasileira; um traço comum às sociedades latino-americanas. Seria, ainda, uma resposta da sociedade à estratégia de dominação das classes altas, um mecanismo de adaptação às situações perversas da sociedade brasileira. Roberto DaMatta, por sua vez, afirma que o jeitinho é fruto da existência de um sistema social dividido e, até mesmo, equilibrado entre duas unidades básicas – o indivíduo (sujeito das leis universais que modernizam a sociedade) e a pessoa (o sujeito das relações sociais que conduz ao pólo tradicional do sistema). Uma outra autora, Lívia Barbosa, associa-o a um mecanismo de navegação social, “em posição cada vez mais próxima da corrupção”. Em outro contexto, o dramaturgo Nelson Rodrigues cunhou a expressão “Complexo de vira-lata” para afirmar que a autoestima baixa é um dos traços da brasilidade. Originalmente se refere ao trauma sofrido pelos brasileiros com a derrota da Seleção na Copa do Mundo de 1950, mas ia além: “O brasileiro é um narciso às avessas, que cospe na própria imagem”.
O Projeto Brasilidade identifica que, mesmo que não seja possível um balanço homogêneo da produção intelectual sobre a identidade nacional, pode-se concluir que a visão predominante sobre o caráter dos brasileiros era em geral negativa: a miscigenação, por exemplo, foi vista inicialmente como degeneração, só depois interpretada como capacidade de conciliação; o caráter, considerado emocional e pouco polido; e a autoestima, considerada baixa. Embora identifique nos dias atuais a presença de alguns traços apontados por Gilberto Freyre (capacidade de conciliação e erotismo) e Sérgio Buarque de Holanda (cordialidade), o Projeto Brasilidade enterra de vez o complexo de vira-lata apontado por Nelson Rodrigues e aponta melhora da autoestima do brasileiro; mostra que hoje predomina a interpretação positiva do “jeitinho brasileiro”, em oposição à visão negativa de Livia Barbosa que associava o “jeitinho” à corrupção; e, ao contrário de Guerreiro Ramos – que vaticinou o fim do “jeitinho” – o Projeto Brasilidade mostra que o “jeitinho” está muito vivo e a sua dimensão positiva é hoje essencial para a nova identidade do brasileiro.
A identidade do brasileiro
Ao consolidar a identidade do brasileiro 2010, a pesquisa Brasilidade revela que, em contraposição ao ser humano em geral, o brasileiro se considera “mais batalhador”, “mais alegre”, “mais solidário”, “mais criativo/inovador”, “mais prestativo”, “mais justo”, “mais bonito”, “sempre dá um jeitinho”, “mais sofrido”, “mais patriota”, “tem jogo de cintura”. Entre as frases expressas na pesquisa qualitativa estão, por exemplo: “Brasileiros para mim são pessoas alegres, super alegres, … frente aos países… São pessoas que ajudam em qualquer situação… todo mundo voltado em fé, que acredita num futuro melhor.”
No quadro “Consciência de ser brasileiro”, a pesquisa revela (em respostas múltiplas) características como “sou batalhador” (25%); “não perco a esperança nunca” (22%); “adoro futebol” (22%); “convivo bem com todo tipo de gente” (20%); “adoro conviver com amigos” (17%); “sei me virar com pouco dinheiro” (16%); “adoro música” (15%); “sei que para tudo tem um jeitinho” (11%). Traços que revelam um ser alegre, emocional e musical, que vive o presente e tem na adaptação e na flexibiidade a sua maior ferramenta de vida. Um lutador otimista, que gosta do convívio e vive com pouco.
Nas regiões Centro-Oeste e Norte – 31% e 35%, respectivamente – há os maiores índices da percepção do brasileiro como um batalhador. A característica de “nunca perder a esperança” recebe destaque nas classes A (32%) e B (27%); e nas regiões Norte (39%) e Nordeste (28%). É também na região Norte que o amor pelo futebol é citado com maior destaque como característica que define o brasileiro (48%).
Como um “batalhador”, o brasileiro se considera um lutador permanente, que já nasceu em desvantagem – tem menos, pode menos, sabe menos. Justamente por isso transforma as fraquezas em fonte de energia; ele precisa de menos, aprende com a vida, adapta-se facilmente e inventa o que precisa. Em contrapartida, também em relação ao ser humano em geral, o brasileiro se considera menos amigo, menos inteligente, menos corajoso, menos competitivo, menos agressivo, menos consumista, menos estressado.
Embora não se veja como amigo, sabe que é solidário ao salvar quem precisa; afinal, amanhã pode ser ele a precisar de ajuda. Segundo Ribeiro, “o brasileiro se acha menos amigo porque se estreitar as relações terá que ajudar a criar os filhos do amigo, emprestar dinheiro, oferecer o próprio nome para compras no crédito”. “O brasileiro acredita que é patriota, embora isso não represente uma adesão ao País oficial, pois sente vergonha dos governantes, dos políticos e da política. Mas, é um indivíduo que acredita no brasileiro, na força de vontade do povo e no potencial. Além disso, tem um jeito próprio e alegre de se relacionar com os outros, de tocar a vida”, acrescenta Ribeiro.
“Jeitinho”, o DNA do brasileiro
A população pesquisada avaliou o “jeitinho brasileiro” como atributo relevante mais exclusivo para definir a brasilidade – sempre considerado em uma dimensão mais positiva que negativa. Ou seja, o “jeitinho” correspondeu à diferença mais significativa entre os atributos apontados para o ser humano em geral e o brasileiro – 22% dos entrevistados responderam que o brasileiro “sempre dá um jeitinho”, enquanto apenas 6% afirmaram que o ser humano em geral “sempre dá um jeitinho”, uma diferença portanto de 16 pontos percentuais, a maior constatada em relação aos demais atributos que caracterizam o brasileiro. Diferenças significativas se deram também nas características ser “batalhador”, ser “alegre e feliz”, “ser patriota” e “ter jogo de cintura”, consideradas bem mais específicas do brasileiro do que das pessoas em geral.
A classe A e os moradores da Região Norte foram os que mais apontaram o “jeitinho” como característica que define o brasileiro. A leitura da pesquisa mostra que a visão positiva do “jeitinho” predomina e se expressa em frases como: “jogo de cintura”; “característica do povo artista”; “um jeito de resolver os problemas, mantendo a alegria, não perdendo a fé”; “criatividade e improviso” etc.
Esse jeitinho brasileiro está portanto mais identificado com a ginga, adaptabilidade, inventividade e criatividade: “tudo o que nos difere, na percepção do brasileiro, da dureza e frieza dos europeus”, afirma Ribeiro, acrescentando que o brasileiro associa a competitividade e agressividade a características ruins, algo que não combina com a alma do brasileiro.
Em menor escala, há, ainda, os que atribuem ambiguidade: “meios e métodos não legais que o povo busca para ter a tranquilidade”; “eu acho que é malandragem, mas é também uma coisa de sobrevivência” etc. Entre os que atribuem características negativas, as frases mais frequentes são: “um jeito de levar vantagem”; “o jeitinho da malandragem” etc.
“Hierarquia das Necessidades”
Um dos destaques da pesquisa Brasilidade é a análise da “Hierarquia das Necessidades”, que tomou por base a teoria de motivação de Maslow – para o qual as necessidades dos seres humanos obedecem a uma hierarquia, ou seja, seguem uma escala de valores transpostos. Pelo modelo, no momento em que o indivíduo realiza uma necessidade, surge outra para substituí-la, exigindo que as pessoas busquem meios de satisfazê-la. Na prática, poucos indivíduos procuram reconhecimento pessoal ou status se as necessidades básicas estiverem insatisfeitas, inconclusas. O modelo mostra que o indivíduo busca, inicialmente, garantir as necessidades básicas (alimento, abrigo, sono, reprodução da espécie etc); passando, na sequência, a buscar segurança (proteção contra ameaças ou privação) e somente a partir da conclusão dos níveis anteriores, passa ao estágio do aprimoramento pessoal e espiritual: necessidades de autorrealização, estima e sociais.
O estudo Brasilidade aponta três perfis de brasileiros em 2010 e mostra a mobilidade social de um grande contingente que ascendeu da condição da luta pela sobrevivência para um estágio de consolidação de uma nova posição; um aspecto determinante para a mudança da estrutura da sociedade brasileira. Há, sem dúvida, correlação entre as alterações da pirâmide socioeconômica e os resultados verificados no estudo. Sob a ótica dos três perfis, é possível entender o brasileiro 2010 e o seu comportamento social, político, ecológico e grau de consciência cidadã.
Aprimoramento (36%)
Com maior concentração nas classes A e B – sendo 56% de mulheres, maior presença entre a faixa etária de 18 a 30 anos e maiores de 50 anos –, os brasileiros na situação de Aprimoramento valorizam primordialmente os aspectos relacionados ao lazer, a espiritualidade, o cuidado com relacionamentos pessoais e a qualidade de vida. O grupo se mostrou heterogêneo e reúne a elite econômica e cultural do País, acolhendo a maior parcela dos movimentos emergentes na cultura, estética, tecnologia, engajamento ecológico e consciência cidadã. Contudo, por se encontrar em posição privilegiada em relação aos demais brasileiros, mostra um lado etnocêntrico, preconceituoso e soberbo, julgando-se melhor que os demais. Na percepção dos integrantes desse grupo, o brasileiro é um povo acomodado, flexível, corajoso, sempre dá um jeitinho, patriota e consumista.
Estabilidade (26%)
Há certa distribuição desse perfil entre as classes, embora haja maior concentração entre os integrantes das classes A, B e C; e mais homens (58%). Esses são brasileiros que se preocupam, especialmente, com a valorização profissional, moradia, educação e trabalho. A maior concentração está na faixa etária entre 25 e 50 anos; pessoas que têm por hábito acompanhar o noticiário econômico. Esse grupo é representado por profissionais em cargos de responsabilidade; pessoas focadas em objetivos profissionais que abarcam melhoria de performance, empregabilidade e produtividade. Por cuidar da família – pais, sogros, irmãos desempregados e amigos que perderam a posição devido fusões entre multinacionais – esse indivíduo reclama das mazelas do País e espera que alguém dê conta de resolvê-las, pois ele não tem tempo. Os integrantes desse grupo associam o brasileiro a características como: competitivo, estressado, inteligente, batalhador, bonito/atraente e prestativo. Batalhador e prestativo são os mais associados a traços da brasilidade.
Sobrevivência (38%)
Com maior concentração nas classes C, D e E, os brasileiros desse grupo são 82%, sendo 56% mulheres e maior presença entre os com mais de 40 anos. Esse perfil valoriza a situação política, religiosidade, saúde e moradia; é o público-alvo dos programas sociais. Os que lutam pela sobrevivência se dizem felizes, otimistas e patriotas, pois a vida tem melhorado nos últimos anos. Há mais conforto e a percepção dessa nova situação; o poder de compra é mais importante do que ser bem atendido. Entendem a mobilidade social e carregam a enorme vontade de ir além dessa melhora. Esse grupo associa o brasileiro a alegre/feliz, nada sensual, criativo, justo e batalhador – sendo alegre/feliz e criativo/inovador os traços da brasilidade na percepção desse grupo.
Orgulho & vergonha de ser brasileiro
O orgulho de ser brasileiro, um índice da autoestima nacional, foi assinalado por 78% dos entrevistados: 57% responderam que “têm sempre orgulho de ser brasileiro”, enquanto 21,4% responderam que “na maior parte do tempo têm orgulho de ser brasileiro”. Segundo Rodrigo Mendes Ribeiro, o que mais traz orgulho aos brasileiros são as belezas naturais (46%), o Carnaval (33%), os símbolos nacionais (26%) e o povo (31%) – espírito, capacidade, jeito. As belezas naturais são as mais citadas na classe de consumo A (51%) e pelos moradores das Regiões Norte (70%) e Sul (68%) do País; enquanto o jeito de ser do brasileiro é apontado como critério de satisfação especialmente pelos entrevistados da Região Norte (67%). O Carnaval é destaque da classe D (40%) e dos moradores do Norte (61%) e Sudeste (39%). Na classe A, o hino nacional foi citado por 40% e por 51% dos moradores do Norte do Brasil.
No comparativo de orgulho entre as Regiões, as populações do Nordeste e Sudeste têm mais orgulho; as do Sul e Norte menos. Quanto menor a escolaridade, maior o orgulho de ser brasileiro. Quanto à classe social e ao gênero, os ricos são os que têm mais orgulho e as mulheres. Em síntese, a maioria (78%) afirma ter orgulho do Brasil, sendo que mais da metade (57%) destaca que tem orgulho de ser brasileiro; enquanto 22% afirmam que na maior parte do tempo sentem orgulho. Os brasileiros da classe A (86%) são os que se mostram mais orgulhosos – assim como a faixa etária de 65 a 70 anos (83%) e as pessoas com menor escolaridade. O Nordeste apresenta o maior índice de orgulho do País (88%); o Sul apresenta o menor (56%).
“Esses dados indicam que há uma percepção positiva dos indivíduos em relação ao país, ou seja, uma avaliação de ordem positiva que implica em uma autoestima mais elevada”, afirma Ribeiro. Há a tendência de passar a avaliar o Brasil cada vez melhor; uma avaliação positiva que implica necessariamente na autoestima mais elevada. Na prática, orgulho, avaliação positiva do País e a predominância de uma visão de futuro positiva marcam a ruptura com o “complexo de vira-lata”. Embora haja uma relação de orgulho, não há uma relação incondicional, baseada em uma visão apaixonada e cega.
A outra face da moeda – a vergonha – manifesta-se, sobretudo, na rejeição aos políticos e aos partidos. Sentir-se maltratado pelos governos e rejeitar a forma como o Estado atende o cidadão é também um traço da brasilidade. Existe unanimidade nacional negativa pela forma como o País é governado e por seus políticos; diante dessa percepção e por não vislumbrar saída, a democracia é questionada. Entre o grupo “aprimoramento”, 73% têm vergonha dos políticos, partidos, mau uso das verbas públicas, da má qualidade dos serviços e da democracia brasileira; contra 67% e 61% dos grupos “estabilidade” e “sobrevivência”, respectivamente.
Expectativas para o futuro
A República utilizou uma técnica inovadora de pesquisa qualitativa nos grupos focais de São Paulo para avaliar a percepção do brasileiro sobre o futuro do Brasil. Inspirada no livro Código Cultural, de Clotaire Rapaille, a pesquisa foi conduzida com uma abordagem mais profunda e com a identificação de elementos pré-conscientes. As pessoas foram convidadas a fechar os olhos, o moderador conduziu um relaxamento e posteriormente sugeriu uma viagem mental para transpor os participantes a outros lugares, convidando-os a dissertar sobre o que viam sobre o tema sugerido.
Com esse cenário, abordar a brasilidade é falar sobre futuro, sobretudo com uma população em sua maioria otimista – e em especial com relação ao futebol. As populações do Norte e Nordeste são as mais otimistas; as do Sul os mais pessimistas. Membros das classes mais altas têm uma clara tendência a serem mais otimistas em relação ao futuro do País; da mesma forma, as pessoas com faixa etária entre 25 e 39 anos são as mais otimistas. Os brasileiros com escolaridade média ou superior acreditam mais no futuro do Brasil.
Entre as “visões” trazidas pela técnica, predominaram as positivas, mostrando que as pessoas têm esperança de que o País será melhor, que avance com uma moderna tecnologia. Entre os mais velhos, houve uma tendência a voltar para o interior, diminuir o ritmo, trabalhar menos e encontrar a paz e a tranquilidade no lar – segurança, família, casa dos pais. Nas expectativas para o futuro, falou-se sobre a natureza como um desejo de proteger, de voltar a ser como antes. Crianças predominaram nas imagens associadas ao desejo de melhorias nas áreas da saúde e da segurança. A imagem da felicidade também foi constante. Os menos otimistas tiveram dificuldade de projetar o Brasil do futuro – viram construções inacabadas, crianças nas ruas e pedindo esmolas, e fome.
RECORTES DO PROJETO BRASILIDADE
Brasilidade & Escolaridade
No tocante à escolaridade, o Norte e o Nordeste têm os índices mais altos de analfabetismo. A correlação entre classe social, renda e escolaridade é muito forte – 80% dos analfabetos são da classe D e 53% dos que têm curso superior pertencem à classe A. O analfabetismo está ligado à geração, sendo que entre os brasileiros com idade entre 60 e 70 anos a taxa é de 27%; entre 40 e 59 anos cai para 14%; e entre os com até 30 anos é de 4%. O nível de escolaridade sobe de forma acentuada entre os brasileiros mais novos: apenas 22% das pessoas com mais de 60 anos estudaram até o ensino médio ou superior; entre os jovens de 25 a 29 anos, 59% já passaram, no mínimo, pelo ensino médio. A escolaridade é determinante para uma melhor posição do indivíduo na sociedade – dos que estudaram até a terceira série do ensino fundamental, 75% têm renda familiar de até R$ 725; dos que fizeram curso superior, 83% ganham mais de R$ 2 mil.
Brasilidade & Renda
No Brasil, 63% das famílias vivem com uma renda mensal de menos de R$ 1.193; o Nordeste, seguido pelo Norte, concentra a população com rendas mais baixas; enquanto o Sul as mais altas. No País, 38% exercem o trabalho autônomo (ou informal) sendo que quanto mais baixa a classe social, maior o número de trabalhadores autônomos. Embora o nível de emprego tenha subido – 57% dos brasileiros estão empregados –, o desemprego ainda é muito alto (18%) sobretudo entre as mulheres, pessoas com ensino fundamental e jovens com idade entre 18 e 24 anos.
Norte e Nordeste são as regiões com maior nível de desemprego – respectivamente 41% e 39%. A análise mostra que apenas 2% dos brasileiros com curso superior estão desempregados; índice que sobe para 20% entre os que só têm o curso fundamental. A relação entre número de dependentes é maior na classe D (25%); o Nordeste apresenta o maior índice com 29% das pessoas dependendo da renda de outra. No que se refere à população produtiva, o Centro-Oeste apresenta o maior percentual (78%) e o menor índice de dependentes (8%).
Mais de metade dos brasileiros com idade entre 50 e 64 anos são produtivos; somente depois dos 65 anos começa a subir o percentual dos que saem do mercado de trabalho; entre os da faixa etária de 18 a 24 anos, 55% estão trabalhando; o maior percentual de produtivos está na faixa etária dos 25 aos 49 anos.
Brasilidade & Família
A faixa entre 50 e 59 anos concentra o mair percentual de divorciados, mas os casados são maioria (50,8%). Quanto aos filhos, 67% dos brasileiros os têm; a classe B tem menos filhos que a D. Contudo, a pesquisa mostra que a cada geração a presença dos filhos tem se reduzido – quase 28% dos jovens entre 18 e 24 anos têm filhos, indicando que a vida adulta começa cedo. O número de filhos está proporcionamente atrelado à geração: 52% das pessoas com mais de 50 anos têm mais de três filhos; na faixa de 40 a 49, a média cai para 43% (três filhos ou mais); e na faixa entre 30 a 39 anos para 37%. Os integrantes da classe D têm mais filhos, sendo que 12% possuem mais de cinco filhos. Quanto mais baixa a escolaridade maior a chance de ter mais filhos.
Brasilidade & Religião
Com uma média de 3,75 pessoas por domicílio, os brasileiros são em sua maioria católicos (67,6%) – 85% no Norte e 75% no Nordeste. Há um avanço significativo no número de evangélicos, sendo que no Centro-Oeste eles são 31% da população. No Sul do País, 14% da população declara não ter religião. Quanto à classe social, os evangélicos estão mais presentes nas classes C e D.
Brasilidade & Internet
A maioria dos brasileiros não tem acesso à internet; embora o percentual dos que acessem tenha crescido consideravelmente, a exclusão digital é acentuada sendo a internet associada a um privilégio dos ricos e com escolaridade mais alta. Hoje, 39% dos brasileiros têm acesso à internet – a região Sul apresenta os maiores índices (52%) contra 38% do Sudeste. No Nordeste e no Norte, o índice é de 34%. Em contrapartida, 75% dos brasileiros com filhos ainda não têm acesso.
Sobre a REPÚBLICA – Opinião dos Brasileiros
A República é uma empresa de pesquisa de opinião pública especializada na alma do brasileiro. Comprometida com o País e a sociedade, a República desenvolve estudos relevantes sobre o que pensa e sente o brasileiro. A singularidade do brasileiro que transcende as diferenças de gênero, idade, escolaridade, renda e religião é matéria-prima para uma investigação que associa a pesquisa tradicional à estatística, sociologia, neurociência, antropologia, economia e ferramentas diferenciadas de pesquisa. A série Estudos da República tem a proposta de ir além das fronteiras das pesquisas convencionais para construir um referencial único como base de sustentação para projetos a serem conduzidos para universidades, governos, empresas e organizações da sociedade; estudos que se tornam instrumento da construção de um país melhor.
Com um sistema de inteligência em estratégia, a República tem como objetivos: compreender padrões de comportamento da sociedade; identificar tendências sociais; estruturar um banco de dados que permita acompanhar a evolução da sociedade brasileira; ajudar a produzir uma agenda positiva de fortalecimento da autoestima do povo; permitir uma reflexão crítica das raízes da identidade nacional; e contribuir para a formação de uma cidadania ativa e consciente. Dirigida pelo sociólogo e mestre em Ciência Política, Rodrigo Mendes Ribeiro, a República tem sede em São Paulo e escritórios no Rio Grande do Sul (Porto Alegre) e Minas Gerais (Belo Horizonte).
Sobre o PROJETO BRASILIDADE
O Projeto Brasilidade, primeiro da série Estudos da República, baseia-se na pesquisa minuciosa da autopercepção do brasileiro, investigando o impacto de duas décadas de democracia e de estabilidade econômica na identidade e na autoestima nacional. Brasilidade parte do estudo das raízes do Brasil – por da obra de autores clássicos como Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Hollanda, Darcy Ribeiro e Roberto DaMatta – para abrir um diálogo com os brasileiros. Concluído em 2010, o Projeto Brasilidade integrou uma equipe multidisciplinar composta por antropólogos, psicólogos, cientistas políticos e sociólogos, entre outros estudiosos, para iniciar o processo de pesquisa com brasileiros de todas as regiões do País. Hoje, Brasilidade revela o que significa ser brasileiro no século 21, redescobrindo o “jeitinho brasileiro” e rompendo antigos estereótipos da alma nacional.
O banco de conhecimento gerado é rico, surpreendente e demolidor de preconceitos; conhecimento que derruba mitos e estabelece novos parâmetros para entender como o brasileiro se sente perante o mundo e a si mesmo. Entre as perguntas que motivaram a profunda investigação da alma verde-e-amarela estão: Como o brasileiro vê o País e o seu futuro dentro dele? Como toma decisões? Como reage diante dos estímulos da comunicação? e O que é a brasilidade, esse amálgama que leva pessoas tão diversas a identificar-se como uma só nação?
Rodrigo Mendes Ribeiro
Sociólogo e cientista político com MBA em Marketing e mestre em Ciência Política pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Rodrigo Mendes Ribeiro é diretor-geral da República – Opinião dos Brasileiros, empresa de pesquisa de opinião pública. Desde 2004, o sociólogo e cientista político – que participou de mais de 500 projetos de pesquisa em todo o Brasil – coordena as pesquisas de concepção e avaliação da campanha de esclarecimento ao eleitor “Vota Brasil”, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Professor de pós-graduação na UFMG, Ribeiro atuou como professor de pós-graduação em várias universidades e é autor dos livros Marketing Político – o poder da estratégia nas campanhas eleitorais e Marketing eleitoral: aprendendo com campanhas municipais vitoriosas. Desde 2002 é diretor da Associação Brasileira de Consultores Políticos em Minas Gerais.
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