sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Real continuará valorizado diante do dólar

O Brasil precisa ter uma agenda de médio e longo prazos focada na competitividade. Reclamar do real valorizado não adianta, porque a tendência é de a moeda brasileira se manter forte diante do dólar.
O conselho é do economista Otaviano Canuto, vice-presidente do Banco Mundial (Bird), que participou  em São Paulo do seminário de lançamento do Observatório da Indústria, centro de estudos da Confederação Nacional da Indústria (CNI).

“A pressão (do câmbio) será quase inevitável. A gente tem de se preparar para ela. A agenda é trabalhar naquilo que pode compensar a tendência negativa que o câmbio valorizado vai trazer”, afirmou Canuto. Na avaliação dele, o dólar continuará a se desvalorizar no mundo todo porque os Estados Unidos e os demais países desenvolvidos já usaram o recurso dos juros baixos o quanto podiam e agora estão usando a emissão de moedas, para que seus produtos fiquem atrativos no resto do mundo e voltem a vender.
Segundo ele, é hora mais do que nunca de correr com a logística, com a simplificação do ambiente de negócios, redução do custo Brasil e racionalização da estrutura tributária para permitir que a competitividade dos produtos não baseados em recursos naturais, como equipamentos, seja igual à dos estrangeiros.

“Para de ficar só reclamando do câmbio como se ele fosse uma variável separada do resto dos instrumentos de política econômica, faça pressão para que o governo tenha um programa fiscal que permita o juro baixar e trabalhe o custo Brasil, porque a valorização do real é inexorável nesse contexto.

O Observatório da Indústria, “think tank” criado pela CNI, tem exatamente o papel de reunir especialistas nas mais diversas áreas para debater os problemas estruturais do país e fomentar possíveis soluções. Otaviano Canuto identificou a questão do câmbio que, de uma maneira mais complexa, está ligada também à chamada doença holandesa, que segundo a literatura econômica afeta países com abundantes recursos naturais (como o petróleo do pré-sal brasileiro). Para driblar a doença holandesa, que faz a moeda local se valorizar, o Brasil tem de ganhar competitividade nas demais áreas, como transportes, financiamento, regulação, tributação, etc.

Outra área apontada no seminário de lançamento do Observatório da Indústria foi a inovação. Para o coordenador executivo do Observatório da Inovação da Universidade de São Paulo (USP), Mário Sérgio Salerno, falta uma política industrial de incentivo à inovação. “O Brasil pode crescer por causa dos investimentos tradicionais em infraestrutura. Pode ser, mas ele vai ficar só nisso e depois vai parar de crescer”, disse.

“Não dá para pensar que seremos um grande país com uma grande indústria pensando apenas em estrada e porto. É preciso investir em inovação. Conjugar a agenda do século XIX com a agenda do século XXI”, explicou. De acordo com Salerno, é preciso aprofundar as políticas de financiamento à inovação que estão sendo gestadas pelo Movimento Empresarial pela Inovação (MEI), liderado pela CNI. “Se não dermos esse salto, vamos ficar para trás na corrida”, salientou.

O presidente da União da Indústria da Cana-de-Açúcar (Única), Marcos Jank, apontou uma contradição que o Brasil tem de resolver no curto e médio prazos para definir os rumos no longo prazo. “Vivemos uma certa contradição, porque somos um país que se propõe a ser uma economia de baixo carbono, como de fato já é, e ao mesmo tempo podemos virar um grande exportador de petróleo. Parece uma fusão da economia do século retrasado com a economia do século XXI”, afirmou Jank. Para ele, as saídas para o novo modelo de desenvolvimento do Brasil poderão ser apontadas pelo Observatório da Indústria. “É para isso que estamos aqui, para pensar o futuro”, lembrou.

O diretor-executivo da CNI, José Augusto Fernandes, definiu o Observatório: “Tem o objetivo de juntar acadêmicos e a indústria para refletir temas que não estão neste momento no nosso radar mas que terão impacto no ambiente que a indústria opera”. “Esperamos ter uma espécie de janela para fugir do cotidiano”, finalizou.

O Observatório da Indústria da CNI contará com a participação de acadêmicos e empresários, que se reunirão periodicamente para debater temas de interesse do setor industrial e do Brasil, para analisar problemas, identificar oportunidades, apontar soluções e construir propostas de políticas de governo, por exemplo. As conclusões do Observatório da Indústria serão divulgadas à sociedade por meio de seminários, estudos e até da publicação de livros.

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